"A redação estava elétrica", me disse um editor após a descoberta de Shannon Matthews, 9 anos, que esteve desaparecida por 24 dias em fevereiro de 2008. "Minutos após a publicação da história, nós assistimos os cliques subirem como um jorro de petróleo. Em apenas uma hora, nós recebemos 60 mil acessos!"
À medida que jornais e empresas de radiodifusão avançam online, elas estão encontrando novas formas de julgar o que torna grande uma história. Usando as mais recentes tecnologias de "análise da Internet", os editores agora podem monitorar os rastros do "clickstream" - (fluxo de cliques) uma medição do que seus usuários optam por ler, assistir e compartilhar. As redações agora contam com telas planas gigantes suspensas do teto e pequenos aparelhos de mesa que inundam seus funcionários com um fluxo impiedoso de estatísticas da internet. Nunca antes o jornalismo de mercado foi tão visível.
Este admirável mundo novo tem aspectos positivos. As empresas de mídia podem oferecer precisamente propagandas "comportamentais" dirigidas, permitindo aos seus clientes visarem mensagens a grupos bem definidos de usuários. Alguns estão até mesmo utilizando ferramentas de neurociência para medir as fundações subconscientes do clickstream - explorando dados biométricos (atividade das ondas cerebrais, monitoramento dos olhos e resposta da pele) para avaliar a eficácia dos formatos das propagandas online. Em um momento de redução dos orçamentos publicitários, essas inovações podem salvar a pele do setor de mídia.
A nova tecnologia também ajuda as organizações de notícias a aprender como seus clientes gostam de receber suas notícias. A feroz concorrência online está promovendo melhores sites (por meio de vídeos, mapas interativos ou novos mundos virtuais), criando novas formas de interação com o público (por meio de blogs e murais de mensagens) e novos estilos de texto (organizados em torno de hiperlinks e "metadados semânticos"). Também as está forçando a compartilhar e colaborar: no início de março, o "The Guardian" anunciou que estava dando livre acesso para terceiros a toda sua infraestrutura digital. Mais importante, o clickstream fornece aos editores o retorno que os ajuda a reembalar notícias importantes, porém menos populares - como histórias do Afeganistão - para o maior público possível. Isso poderia tornar conteúdo de utilidade pública mais acessível - e todas as notícias mais envolventes e relevantes.
Mas há um lado sombrio óbvio. Em sua sede por retorno, os sites de notícias agora apresentam rankings provocantes, classificando as histórias por "mais clicadas" ou "mais enviadas por e-mail". Com algumas exceções, os rankings são dominados por aquelas que envolvem os aspectos mais bizarros, mais idiossincráticos da existência humana, às custas de assuntos sérios porém abstratos, como o desenvolvimento internacional ou o meio ambiente.
A ironia disso não passou desapercebida pela revista satírica "The Onion", que publicou uma história (piada) em 2007 alegando que a lista das "mais encaminhadas por e-mail" estava "fazendo em pedaços a redação do 'New York Times'". Sob pressão para "produzir artigos com estas qualidades mágicas de 'clicar e enviar'", alegava o artigo, os repórteres ganhadores do Prêmio Pulitzer tinham "pedido transferência para a estação de Viagem e Casa & Jardim", onde o perfil digital deles provavelmente cresceria mais.
Mas esses assuntos, na verdade, são muito sérios. Enquanto os números de circulação dos jornais caem acentuadamente, especialmente nos mercados locais e regionais, é lógico que os publishers se aconcheguem sob o guarda-chuva das histórias populares. Ao refletir os interesses do público, eles podem atrair milhões de olhares e mais anunciantes. Este processo, por sua vez, estreita artificialmente o noticiário em torno de um punhado de histórias "principais" - como Shannon Matthews ou a situação difícil de Jade Goody. Também é mais fácil (e mais barato) rechear seu conteúdo com material pronto das agências de notícias ou de boletins de imprensa. Histórias que precisam ser encontradas, desenvolvidas e verificadas por uma rede internacional permanente de jornalistas são caras em comparação. E o clickstream também pode enviar um forte sinal de fadiga. Isto foi especialmente verdadeiro durante a guerra em Gaza. Enquanto a guerra se arrastava, o tráfego na internet por histórias de Gaza caiu acentuadamente. O conhecimento de que este assunto aparentemente importante afastava os leitores colocou pressão sobre os editores para reduzirem a cobertura do conflito tanto em seus jornais quanto online.
Hoje, apenas um punhado de publishers parece imune a estas tentações -principalmente aqueles cujos custos são subsidiados, como "The Guardian" (via o Scott Trust) e a "BBC" (via a taxa de licença britânica), ou cujo modelo de negócios se apóia no fornecimento de uma análise especializada, como o "Financial Times". A maioria, por outro lado, está exposta a uma mudança sem precedente na demanda por notícias.
Os riscos de seguir cegamente o público estão claros aqui. Como Paul Starr argumentou recentemente no "New Republic", os jornalistas há muito são "nossos olhos no Estado, nossa proteção contra os abusos privados, nossos sistemas de alarme cívico". As novas tecnologias oferecem ótimas oportunidades mas, se mal usadas, podem colocar em risco o futuro da sociedade civil.
À medida que jornais e empresas de radiodifusão avançam online, elas estão encontrando novas formas de julgar o que torna grande uma história. Usando as mais recentes tecnologias de "análise da Internet", os editores agora podem monitorar os rastros do "clickstream" - (fluxo de cliques) uma medição do que seus usuários optam por ler, assistir e compartilhar. As redações agora contam com telas planas gigantes suspensas do teto e pequenos aparelhos de mesa que inundam seus funcionários com um fluxo impiedoso de estatísticas da internet. Nunca antes o jornalismo de mercado foi tão visível.
Este admirável mundo novo tem aspectos positivos. As empresas de mídia podem oferecer precisamente propagandas "comportamentais" dirigidas, permitindo aos seus clientes visarem mensagens a grupos bem definidos de usuários. Alguns estão até mesmo utilizando ferramentas de neurociência para medir as fundações subconscientes do clickstream - explorando dados biométricos (atividade das ondas cerebrais, monitoramento dos olhos e resposta da pele) para avaliar a eficácia dos formatos das propagandas online. Em um momento de redução dos orçamentos publicitários, essas inovações podem salvar a pele do setor de mídia.
A nova tecnologia também ajuda as organizações de notícias a aprender como seus clientes gostam de receber suas notícias. A feroz concorrência online está promovendo melhores sites (por meio de vídeos, mapas interativos ou novos mundos virtuais), criando novas formas de interação com o público (por meio de blogs e murais de mensagens) e novos estilos de texto (organizados em torno de hiperlinks e "metadados semânticos"). Também as está forçando a compartilhar e colaborar: no início de março, o "The Guardian" anunciou que estava dando livre acesso para terceiros a toda sua infraestrutura digital. Mais importante, o clickstream fornece aos editores o retorno que os ajuda a reembalar notícias importantes, porém menos populares - como histórias do Afeganistão - para o maior público possível. Isso poderia tornar conteúdo de utilidade pública mais acessível - e todas as notícias mais envolventes e relevantes.
Mas há um lado sombrio óbvio. Em sua sede por retorno, os sites de notícias agora apresentam rankings provocantes, classificando as histórias por "mais clicadas" ou "mais enviadas por e-mail". Com algumas exceções, os rankings são dominados por aquelas que envolvem os aspectos mais bizarros, mais idiossincráticos da existência humana, às custas de assuntos sérios porém abstratos, como o desenvolvimento internacional ou o meio ambiente.
A ironia disso não passou desapercebida pela revista satírica "The Onion", que publicou uma história (piada) em 2007 alegando que a lista das "mais encaminhadas por e-mail" estava "fazendo em pedaços a redação do 'New York Times'". Sob pressão para "produzir artigos com estas qualidades mágicas de 'clicar e enviar'", alegava o artigo, os repórteres ganhadores do Prêmio Pulitzer tinham "pedido transferência para a estação de Viagem e Casa & Jardim", onde o perfil digital deles provavelmente cresceria mais.
Mas esses assuntos, na verdade, são muito sérios. Enquanto os números de circulação dos jornais caem acentuadamente, especialmente nos mercados locais e regionais, é lógico que os publishers se aconcheguem sob o guarda-chuva das histórias populares. Ao refletir os interesses do público, eles podem atrair milhões de olhares e mais anunciantes. Este processo, por sua vez, estreita artificialmente o noticiário em torno de um punhado de histórias "principais" - como Shannon Matthews ou a situação difícil de Jade Goody. Também é mais fácil (e mais barato) rechear seu conteúdo com material pronto das agências de notícias ou de boletins de imprensa. Histórias que precisam ser encontradas, desenvolvidas e verificadas por uma rede internacional permanente de jornalistas são caras em comparação. E o clickstream também pode enviar um forte sinal de fadiga. Isto foi especialmente verdadeiro durante a guerra em Gaza. Enquanto a guerra se arrastava, o tráfego na internet por histórias de Gaza caiu acentuadamente. O conhecimento de que este assunto aparentemente importante afastava os leitores colocou pressão sobre os editores para reduzirem a cobertura do conflito tanto em seus jornais quanto online.
Hoje, apenas um punhado de publishers parece imune a estas tentações -principalmente aqueles cujos custos são subsidiados, como "The Guardian" (via o Scott Trust) e a "BBC" (via a taxa de licença britânica), ou cujo modelo de negócios se apóia no fornecimento de uma análise especializada, como o "Financial Times". A maioria, por outro lado, está exposta a uma mudança sem precedente na demanda por notícias.
Os riscos de seguir cegamente o público estão claros aqui. Como Paul Starr argumentou recentemente no "New Republic", os jornalistas há muito são "nossos olhos no Estado, nossa proteção contra os abusos privados, nossos sistemas de alarme cívico". As novas tecnologias oferecem ótimas oportunidades mas, se mal usadas, podem colocar em risco o futuro da sociedade civil.
Tradução: George El Khouri Andolfato
Matéria veiculada no Folha Online no dia 16/04/2009
veja também esse blog: http://www.clickstream.ie/blog/
ResponderExcluirEsse é o Link da Matéria
ResponderExcluirhttp://noticias.uol.com.br/midiaglobal/prospect/2009/04/16/ult2678u214.jhtm