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quinta-feira, 13 de maio de 2010

Gestão de topo precisa de “leitores” da cultura

Este post é SIMPLESMENTE sensacional. Grande e longo. Não importa!


É possível clonar Steve Jobs? Em entrevista ao VER, o antropólogo do MIT e consultor de negócios Grant McCracken, explica por que motivo as empresas precisam, com urgência, de se concentrar na “leitura” da cultura que as envolve, uma arte em que o CEO da Apple é mestre. Se ignorar a cultura que envolve a sua empresa e o mercado onde opera, pode correr o sério risco de passar à história
POR HELENA OLIVEIRA

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© DR

As empresas mais poderosas do mundo precisam, urgentemente, de pessoas que ocupem cargos na mais elevada hierarquia de liderança e cuja tarefa principal é prestar uma atenção criteriosa à cultura que as envolve. Esta é a proposta de Grant McCracken, antropólogo do MIT, consultor de algumas mais reconhecidas organizações mundiais e considerado como um dos mais provocadores pensadores da actualidade no que respeita à abordagem das mudanças sociais, culturais, tecnológicas e económicas que moldam o mundo em que vivemos. McCracken é um dos fundadores do Convergence Culture Consortium, conhecido no MIT como C3 e que explora as formas como o cenário empresarial está a mudar a sua resposta relativamente à crescente integração dos conteúdos e das marcas em várias plataformas, a par dos papéis proeminentemente significativos dos consumidores no que respeita ao fluxo dos media. McCracken é professor convidado em Harvard, autor de vários livros e consultor de empresas tão diferentes como a Coca-Cola, a IBM ou a Ikea.

A propósito do seu último livro Chief Culture Officer: How to Create a Living Breathing Corporation – considerado pela BusinessWeek como o mais inovador de 2009 e que, apesar de não estar traduzido, pode ser adquirido em Portugal – o VER entrevistou Grant McCracken. A intenção foi vislumbrar por que motivo a cultura é tão importante para as organizações e o que têm estas a ganhar com uma nova figura – a de CCO – na liderança de topo.

O argumento principal do livro de McCracken afirma que qualquer empresa precisa de um Chief Culture Office que consiga antecipar as tendências culturais em vez de se sentar passivamente à espera que elas apareçam, para só depois reagir. Os CCOs deverão ter a capacidade de processar quantidades massivas de informação e identificar os desenvolvimentos cruciais no meio de uma ampla e variada gama de possibilidades. Desta forma, terão capacidade de vislumbrar o futuro que está a chegar, independentemente da indústria que servem, criando assim valor para os seus accionistas, alterando os seus produtos e originando novas fontes de lucro. McCracken lista, nesta obra, um conjunto de indivíduos que estão profundamente relacionados e sintonizados com o zeitgeist (o denominado “espírito dos tempos”), entre os quais se destacam Steve Jobs, A.G. Lafley ou o autor Johnny Depp – que lutou contra a Disney para integrar “maneirismos” na personagem que interpreta em “Pirata das Caraíbas” – mas também empresas como a Starbucks ou a Nike que possuem uma “cultura refashioned”.

Eis as respostas de McCracken sobre o novo CCO.

O que é realmente um CCO e por que motivo é que o mundo organizacional precisa de mais um “cargo”?

Um CCO é um gestor sénior que tem como função “ler” a cultura que envolve a empresa para onde trabalha com o objectivo de vislumbrar oportunidades de novas receitas e evitar perigos que dela possam advir.

Como é possível convencer a gestão de topo de que as “revelações” culturais são valiosas para os negócios da actualidade e, especialmente, para as empresas em que trabalham?
No meu livro são apresentados vários exemplos de organizações que se limitaram a observar, enquanto outras encontraram novas oportunidades nessa leitura da cultura, arquitectando com mestria novos produtos e serviços que a expressam. A Nike, a Starbucks, a Unilever, a Coca-cola, a HBO, a Method e a Disney são excelentes exemplos dessa leitura. Mas também analisei a Quaker, a Best Buy, a Levi-Strauss, a Pepsi.Co e a General Motors. E, em cada um destes últimos casos, as organizações falharam ao não perceber que a cultura estava a sofrer alterações, o que as fez deslizar do seu pedestal. A penalização colectiva deste fracasso no caso das três primeiras empresas [a Quaker, a Best Buy e a Levi-Strauss]: 3 mil milhões de dólares. (As minhas desculpas por os exemplos serem centrados nos Estados Unidos. Estou a preparar uma “sequela” para trabalhar com exemplos europeus. E era muito bom que os vossos leitores quisessem contribuir com exemplos, maus e bons, que eu pudesse utilizar).

As características culturais são extremamente difíceis de mudar. Quais são os seus principais conselhos para transformar uma empresa “morta ou em estado comatoso” numa outra que respire vida?
Sim, é verdade que elas são difíceis de mudar. Mas acredito que quanto mais receptivas as organizações forem à cultura exterior mais vivas se tornarão, e mais divertidas serão enquanto local de trabalho. Todos nós sabemos muito sobre cultura. Poderão ser filmes, música, desporto ou shows televisivos. Está na altura de colocar este conhecimento ao serviço da empresa. É tempo de o partilhar com os nossos pares. Está na hora de utilizar aquilo que sabemos e trazermos “todo o nosso eu” para o trabalho.

Deverá um CCO começar o seu trabalho através da análise da cultura organizacional interna e depois adaptá-la à que vigora no exterior ou são as tendências culturais do “mundo lá fora” as primeiras que devem ser apreendidas?

Não existe nenhuma razão para que não possamos fazer ambas as coisas. Mas a minha preferência vai no sentido de se descobrir que tipo de conhecimento as pessoas no interior da empresa têm da cultura que existe lá fora e arranjar uma forma de a integrar para “preencher as falhas”.

Que tipo de ferramentas deverão estar ao dispor de um CCO?
A ideia é sermos o mais abrangente possível. Por exemplo, é necessário estar por dentro do que se passa no na indústria cinematográfica, desde o mainstream, aos filmes globais, locais ou alternativos; perceber não só a cultura dominante, como aquelas que gravitam nas suas margens. Tenho a esperança que as empresas construam um “quadro gigante” que identifique e siga as tendências e mudanças que realmente interessam. Para que, em qualquer que seja o momento, a gestão de topo possa dizer “aqui estão as três grandes oportunidades e os três maiores perigos vindos lá de fora. Esta é a altura em que pensamos que elas irão atingir os nossos mercados. E aqui estão as inovações que temos prontas para quando isso acontecer”. É similar às previsões meteorológicas (ou seja, quando nos dizem “pensamos que esta zona de altas pressões nos vai atingir”). Excepto que, no caso da cultura, podemos fazer alguma coisa.

Quem são, a seu ver, as pessoas mais “qualificadas” para encarnarem esta nova personagem nas grandes empresas? Afirmou numa entrevista que considerava que esta era uma oportunidade para a criação de uma nova carreira para os licenciados provenientes das Ciências Sociais e Humanas...
Penso que poderão ser as pessoas mais inesperadas a agarrarem a ocasião. Existem representantes da Geração X e da Y que poderão lá chegar. Apenas precisam de ter mais formação organizacional e preencherem as falhas existentes no seu conhecimento cultural. Penso que o mundo das agências e da estratégia irá produzir alguns players interessantes. Precisam apenas de retirar a sua capacidade analítica para fora da “caixa negra” nas quais as agências os têm amarrados. O mundo do jornalismo e editorial, no geral, irá produzir igualmente excelentes candidatos. Afinal de contas, qualquer bom editor está já a exercer as funções de CCO para os seus leitores. E questiono igualmente se pessoas provenientes do mundo do entretenimento poderão estar igualmente à altura: agentes, produtores e actores são, geralmente, excelentes leitores culturais. Só precisam de abrir mais os seus horizontes. E, com alguma formação suplementar, os CSMO [Chief Social Media Officer] também poderão lá chegar. Existe um conjunto significativo de players potenciais.

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Grant McCkraken © DR

Afirmou também que as escolas de negócios devem ser reinventadas? De que forma?
No panorama actual, as escolas de negócios ignoram, simplesmente, a cultura. Pelo menos as escolas americanas, sendo que estaria muito interessado em saber o que se passa na Europa relativamente a esta questão. A cultura é o próximo “espaço branco” ou “oceano azul” para o mundo dos negócios. [conceito da gestão que se refere às indústrias ainda não existentes – ao espaço de mercado desconhecido, ainda não conquistado pela concorrência. Ou seja, uma analogia para descrever o potencial profundo e vasto de um espaço de marcado ainda não explorado. O conceito ficou conhecido no livro “Blue Ocean Strategy”, escrito por dois reconhecidos professores do INSEAD, W. Chan Kim and Renée Mauborgne e publicado pela Harvard Business School Press. Contudo, outros autores da gestão, como por exemplo Michael Porter, já o tinham anteriormente utilizado]. Quando estava a dar aulas na Harvard Business School, o então Deão Clark, costumava afirmar que o que o mantinha acordado de noite era a possibilidade da existência de uma escola de negócios “algures” que iria desafiar a posição da HBS com algum tipo de inovação que ele não conseguiria antecipar. Penso que ele acreditava que o desafio seria provavelmente uma disrupção de natureza tecnológica. Mas poderia ser algo tão simples como uma transição para a cultura. E com todo o respeito ao meu anterior empregador, esta é uma mudança que a HBS nunca verá chegar.

Na sua opinião, quais os principais problemas com que se confronta o mundo empresarial moderno?
Penso que estamos todos demasiado dominados pelas usurpações da economia. Ou seja, vemos os clientes e os consumidores demasiado envolvidos na perseguição estreita e imediata do seu próprio interesse e nós, enquanto fornecedores, oferecemos um valor definido de forma limitada. Gosto da forma como AG Lafley, presidente do conselho de administração e CEO [da Procter & Gamble], nos pediu para alargar os horizontes e olharmos para o “quadro” de longe e percebermos que os consumidores são moldados por forças muito maiores do que esses interesses limitados. Eles são criaturas que vivem na cultura, que consomem cultura, que produzem cultura. E eles estão a viver e a respirar. Ou seja, é tempo para a empresa cultivar um quadro maior no sentido de perceber como é que se cria valor.

“Elegeu” Steve Jobs, o CEO da Apple como um excelente CCO, embora ele seja conhecido como uma pessoa extremamente difícil. A minha questão é a seguinte: qual a “responsabilidade” de um CEO para influenciar a cultura de uma organização?
Steve Jobs é um líder extraordinário. Mas é igualmente um guru que não nos deixa conhecer o seu método de génio. Demasiadas vezes as organizações dependem de um guru que insiste em que confiemos cegamente na sua intuição ou no seu génio criativo. E, obviamente, desejamos que eles partilhem connosco a sua intuição, ao mesmo tempo que nos sentimos gratos pela sua genialidade. Contudo, um CCO ajuda-nos a fazer um “reverse engineer” neste tipo de inspiração para que o possamos submeter a um escrutínio, e para que os mercados de investimento possam olhar e fazer as suas apostas adequadamente. Dizer “limitem-se a confiar em mim” não é a abordagem perfeita para construir um sentimento de confiança por parte dos investidores.

Há cerca de uma década, Jack Welch era celebrado como um dos maiores líderes de sempre e a cultura da General Electric era igualmente um caso de estudo nos negócios. Quais são as principais diferenças – em termos culturais – que tem vindo a identificar nas organizações ao longo da sua carreira?

As empresas têm vindo a dizer que o “consumidor é rei” desde 1912. E a maioria das operações B2C [business to consumer] tem estado mais ou menos atenta ao perfil do consumidor e ao que ele deseja. Mas a verdade é que este consumidor existe num enorme glaciar de cultura, um corpo vasto de significados e regras que fazem com que os seus mundos, os seus gostos e as suas preferências ganhem sentido. E, mais uma vez, afirmo que está na altura de termos uma compreensão sistemática do que tudo isto significa.

As organizações estão também a enfrentar algumas complexidades culturais entre os representantes da geração X, da Y e da “geração net” tal como Don Tapscott os apelida, ou seja, aqueles que nasceram e cresceram na era digital. Como é que se devem “comportar” estas gerações para o bem comum da empresa?
Penso que cada uma destas gerações tem os seus pontos fortes e as suas paixões no que respeita a ler e a agir sobre a cultura. Actualmente, as organizações são, na maioria das vezes, lideradas porboomers que, por vezes, pressupõem que a sua cultura é a cultura de toda a gente. O exemplo que costumo utilizar é que, até há muito pouco tempo, a Mercedes utilizava a voz do actor Richard Thomas nos seus anúncios publicitários. O homem era famoso, pois era a estrela de um conhecido programa televisivo americano - The Walton’s – que terminou em 1980. E metade do mundo não fazia a mínima ideia de quem ele era. Ou seja, está na altura de a empresa retirar benefícios das vantagens culturais que possui. Quando o CEO da Best Buy descobriu que tinha perdido um investimento no valor de 700 milhões de dólares disse qualquer coisa como “qualquer miúdo que trabalha nos armazéns sabia que isto era uma má aposta”. Mas se assim é como é que a gestão de topo não percebeu a mensagem?

Gostaria que definisse as diferenças, expressas no seu livro, entre culturas “rápidas” e “lentas”, bem como entre divergentes e convergentes.
A cultura “fast” é constituída por tudo o que é passageiro, pelas modas e tendências efémeras que caem em torrentes na nossa cultura num dado momento. A cultura “slow” são os fundamentos mais enraizados, os significados e as regras culturais que mudam mais lentamente. Os caçadores de tendências tendem a concentrar-se exclusivamente na cultura “fast”, mas as organizações precisam de manter, em simultâneo, os seus conhecimentos no que respeita à cultura “slow”. Neste momento, vivemos uma cultura crescentemente dispersiva. Temos mais definições do que deve ser um marido, um empregado, um gestor, um homem, uma celebridade, um líder. E esses são quem nós somos. Somos inventivos, de uma forma fantástica, e cada vez mais e mais tolerantes (por vezes abraçando-os) com a variedade dos resultados. No Canadá existe uma expressão muito boa para estas situações caóticas: referimo-nos a “um polícia montado e a cavalgar em todas as direcções ao mesmo tempo”. E essa é a cultura que temos agora. Estamos a cavalgar em todas as direcções em simultâneo. Felizmente, existem igualmente momentos convergentes, momentos esses que acontecem quando chegamos a um consenso alargado sobre uma abordagem partilhada. Nos anos 60, pelo menos no que respeita ao caso norte-americano, existia uma contracultura partilhada. Nos anos 80, a convergência era feita com os “queques ou betinhos”. E nos anos 90, o alternativo era moda. O que acontece é que num dado momento somos influenciados tanto pela divergência como pela convergência presente.

Nota:
Grant McCracken faz um apelo aos executivos portugueses que queiram participar no seu próximo livro que terá como pano de fundo as empresas europeias. Para tal, convidamo-lo a aderir à rede http://chiefcultureofficer.ning.com/ , submeter o seu perfil e contribuir para o debate.


Fonte: http://www.ver.pt

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